A CALÚNIA SOCIALISTA CONTRA OS JUDEUS


O Nazismo combate a mentalidade judaica. Mas até hoje não teve sucesso em definir suas características, porque a mentalidade judaica é tão mítica quanto a raça judaica.

Os antigos nacionalistas alemães tentaram opor à mentalidade judaica uma visão de mundo “Teuto-Cristã”. Esta combinação é, no entanto, indefensável. Nenhum truque exegético pode justificar a reivindicação alemã de uma posição preferencial no reino da Cristandade. Os Evangelhos não mencionam os alemães, consideram todos os homens iguais perante Deus. Quem quer que deseje discriminar não somente os Judeus, mas os descendentes Cristãos dos Judeus, estará em total desacordo com os Evangelhos. O anti-semitismo rejeita a Cristandade.

Não nos compete decidir se a própria Cristandade pode ser chamada de judaica, embora tenha se desenvolvido a partir do credo Judeu, ao reconhecer os Dez Mandamentos como lei eterna e o Velho Testamento como as Sagradas Escrituras. Tanto os Apóstolos como os primeiros membros da comunidade eram Judeus. Pode-se objetar que Cristo não concordava com os ensinamentos dos rabinos, mas é fato incontestável que Deus mandou o Salvador para os Judeus, e não para os Vândalos, e que o Espírito Santo inspirou livros em Hebraico e Grego, e não em Alemão. Para os nazistas levarem a sério seus mitos raciais e acreditar que eles eram mais do que mera oratória para as reuniões do Partido, teriam que erradicar a Cristandade com a mesma brutalidade que usaram contra o liberalismo e o pacifismo. Eles não seguiram este caminho porque sua política nada tinha a ver com racismo.

É muito estranho que num país cujas autoridades oficialmente violentam os Judeus e o Judaísmo nos termos mais repugnantes, que declaram os Judeus fora da lei por conta de seu Judaísmo, e na qual toda e qualquer noção científica cujos autores são suspeitos de “não-Arianismo” – como teoremas matemáticos, hipóteses físicas e procedimentos terapêuticos – os sacerdotes, em milhares de Igrejas de todos os credos, continuem a honrar como fundamento de toda a moral, os Dez Mandamentos revelados ao Judeu Moisés. É estranho que numa Nação na qual é proibido ler ou imprimir qualquer coisa originária de Judeus, os Salmos e suas traduções, adaptações e imitações alemãs continuem sendo cantados. É estranho que os exércitos germânicos, que exultam em massacrar covardemente milhares de indefesas mulheres e crianças Judias, sejam acompanhados por Capelães portando Bíblias. Mas o Terceiro Reich é cheio destas contradições.

Certamente, os Nazistas não aceitam os ensinamentos morais dos Evangelhos. Como nenhum outro conquistador ou guerreiro. A Cristandade não pode ser um obstáculo para as políticas Nazistas, do mesmo modo que se passou com outros agressores.

O Nazismo não apenas não rejeita oficialmente a Cristandade; solenemente se declara um partido Cristão. Os vinte e quatro pontos do “inalterável Programa do Partido” proclamam que o Partido defende a Cristandade positiva, sem nenhuma ligação com as várias denominações ou Igrejas Cristãs. O termo “positivo”, neste sentido, expressa neutralidade a respeito do antagonismo entre as várias igrejas e seitas.

É verdade que muitos escritores Nazistas gostam de denunciar e ridicularizar a Cristandade e planificar uma nova religião Germânica. Porém o Partido Nazista propriamente, não combate a Cristandade mas sim as igrejas Cristãs enquanto estabelecimentos autônomos e agências independentes. Seu totalitarismo não pode tolerar a existência de nenhuma instituição que não seja totalmente submetida ao Füehrer. A nenhum Alemão é permitido desafiar uma ordem estabelecida pelo Estado, ao obedecer a uma autoridade independente. A separação da Igreja e do Estado é contrária aos princípios do totalitarismo. Conseqüentemente, o Nazismo precisa recriar as condições existentes nas Igrejas Luteranas e também à União das Igrejas Prussianas que existia antes da Constituição de Weimar. Nela, a autoridade civil era suprema, mesmo dentro da Igreja. O líder na Nação era também o supremo bispo da Igreja Luterana em seu território, era o jus circa sacra.

O conflito com a Igreja Católica é semelhante. Os Nazistas não podem tolerar nenhum vínculo entre cidadãos Alemães com estrangeiros, ou instituições estrangeiras. Foram dissolvidos até mesmo os Rotary Clubs por serem ligados ao Rotary International, com sede em Chicago. Um cidadão Alemão só deve lealdade ao Füehrer e à Nação. Hitler poderia tolerar o Catolicismo apenas se o Papa residisse na Alemanha e se subordinasse à máquina partidária.

Excetuando-se a Cristandade, os Nazistas rejeitam como judaico tudo que emana de autores Judeus. Esta condenação inclui os escritos de Judeus que contribuíram com idéias essenciais ao próprio sistema Nazista – como Stahl, Lassalle, Gumplowicz e Rathenau. Mas a mentalidade Judaica, como os Nazistas a chamam, não se limita aos Judeus e seus descendentes. Muitos “Arianos” beberam desta mentalidade – como o poeta, escritor e crítico Gotthold Ephraim Lessing, o socialista Frederick Engels, o compositor Johanness Brahms, o escritor Thomas Mann e o teólogo Karl Barth. Eles também são malditos. Existem, portanto, escolas de pensamento, arte e literatura rejeitadas, em seu todo, como judaicas. O pacifismo e o internacionalismo são judaicos, mas também o amor à guerra. Também o liberalismo e o capitalismo, tanto quanto o “espúrio” socialismo dos Marxistas e dos Bolchevistas. Os epítetos de Judeu e Ocidental são aplicados às filosofias de Descartes e Hume, ao positivismo, materialismo e empiriocriticismo, às teorias econômicas subjetivistas, modernas ou clássicas. A música atonal, a ópera Italiana, as operetas e a arte impressionista também são Judias. Em suma, Judeu é tudo aquilo de que os Nazistas não gostam. Se juntarmos tudo que os vários Nazistas estigmatizaram como Judaico, teríamos a impressão de que toda nossa civilização foi uma conquista exclusiva dos Judeus.

De outro lado, muitos defensores do racismo Germânico tentaram demonstrar que todos os homens eminentes das nações não-Germânicas, eram Nórdicos Arianos de ascendência Germânica. O ex-marxista Woltmann, por exemplo, descobriu características Germânicas em Petrarca, Dante, Ariosto, Raphael e Michelangelo, os quais deviam sua genialidade a seus ascendentes Teutônicos. Woltmann estava plenamente convencido de ter provado que “toda a civilização européia, até mesmo os países Eslavos e Latinos, era uma realização da raça Germânica”.

Seria perda de tempo estudarmos tais opiniões. É suficiente reparar que os diversos representantes do racismo Germânico contradizem uns aos outros, tanto ao descrever as nobres características raciais, quanto na classificação dos próprios indivíduos. Freqüentemente contrariam até afirmações que eles mesmos já haviam feito anteriormente. O mito da raça superior foi fracamente elaborado, na verdade.

Todos os defensores do Nazismo insistem reiteradamente que o Marxismo e o Bolchevismo representam a quintessência da mentalidade judaica e que a grande missão histórica do Nazismo é a de erradicar esta peste. É bem verdade que esta atitude não impediu os nacionalistas de cooperar com comunista Alemães para minar a República de Weimar – nem de treinar sua guarda negra nos quartéis de artilharia e bases aéreas soviéticas de 1923 a 1933, ou de estabelecer uma estreita cumplicidade política e militar com a Rússia Soviética de agosto de 1939 a junho de 1941. Não obstante, a opinião pública corrente acredita que Nazismo e Bolchevismo são filosofias - Weltanschauungen – implacavelmente opostas uma à outra. Na verdade existiram nos últimos anos duas tendências políticas principais: os anti-Fascistas, amigos da Rússia (comunistas, companheiros de viagem, progressistas e liberais independentes), e os anticomunistas, os amigos da Alemanha (partidos que vestem diferentes camisas, inapropriadamente chamados “Fascistas” por seus adversários). São raríssimos os verdadeiros liberais e democratas ultimamente. Muitos dos que assim se denominam, não hesitaram em apoiar medidas absolutamente totalitárias e muitos elogiam entusiasticamente os métodos ditatoriais russos.

O fato de que tais grupos lutem um contra o outro não é prova suficiente que suas filosofias e princípios fundamentais sejam diferentes. Sempre houve guerras entre pessoas que aderiam aos mesmos credos e filosofias. Os partidos da esquerda ou da direita estão em conflito porque todos desejam o poder supremo. Carlos V costumava dizer: “Eu e meu primo, o Rei de França, estamos totalmente de acordo; estamos lutando porque ambos desejam a mesma coisa: Milão”. Hitler e Stalin perseguiam os mesmos objetivos; ambos queriam o poder sobre os Bálcãs, a Polônia e a Ucrânia.

Os marxistas não podem admitir que os Nazistas também são socialistas. Aos seus olhos, o Nazismo é o pior dos males do capitalismo. Por sua vez, os Nazistas descrevem o sistema russo como o supra-sumo da exploração capitalista e como uma maquinação diabólica dos Judeus Internacionais para o domínio dos gentios. No entanto, parece claro que ambos os sistemas podem ser considerados socialistas, do ponto de vista econômico. E este é o único ponto de vista que importa na discussão se um sistema é ou não socialista. O socialismo é e sempre foi considerado um sistema de organização econômica da sociedade. É um sistema no qual o governo tem total controle sobre a produção e a distribuição. Como somente o socialismo existente dentro de um país pode ser chamado genuinamente de socialismo, tanto a Rússia como a Alemanha estão certas em chamar seus regimes de socialistas.

Já se os Nazistas e Bolchevistas estão certos em chamar seus partidos de partidos operários é outro assunto. O Manifesto Comunista diz, “O movimento proletário é o movimento autoconsciente independente da imensa maioria”, e é neste sentido que os velhos marxistas costumavam definir um partido de trabalhadores. Os proletários, explicavam, constituem a imensa maioria da Nação; eles próprios devem tomar o poder e estabelecer o socialismo, e não um governo benevolente de minoria. Mas os Bolchevistas abandonaram este conceito. Sendo uma pequena minoria, declaram-se a vanguarda do proletariado, estabelecem a ditadura, dissolvendo à força o parlamento eleito pela maioria e passam a governar pelo direito da força. Certamente esta minoria governante declara que serve melhor aos interesses de todos, na verdade da sociedade como um todo, mas esta sempre foi a pretensão dos governantes oligarcas.

Os Bolchevistas estabeleceram o precedente. O sucesso da camarilha de Lenin encorajou a gang de Mussolini e as tropas de Hitler. Tanto o Fascismo Italiano como o Nazismo Germânico adotaram os métodos políticos da Rússia Bolchevista. A única diferença entre Nazismo e Bolchevismo é que os Nazistas tiveram muito mais votos antes de seu golpe de Estado do que os Bolchevistas nas eleições do outono de 1917.

Os Nazistas não apenas imitaram as táticas Bolchevistas de tomada do poder, mas copiaram muito mais. Importaram da Rússia o sistema de partido único e o papel privilegiado deste partido e de seus membros na vida do País; a enorme importância da polícia secreta; a organização de partidos filiados no exterior, que são empregados para enfrentar os governos locais e sabotar e espionar, protegidos por fundos públicos e pela proteção dos serviços consulares e diplomáticos; a prisão de adversários e sua execução; os campos de concentração; a punição infligida às famílias dos exilados; e os métodos de propaganda. Chegaram a tomar de empréstimo até mesmo absurdos tais como a forma de tratamento pessoal, camarada do partido (Parteigenosse), derivado do marxista camarada (Genosse), e a aplicação de uma terminologia militar para todos os aspectos da vida civil e econômica. A questão principal não é entender em que aspectos os dois sistemas são semelhantes, mas no que diferem.

Já foi demonstrado em quê os padrões socialistas da Rússia e da Alemanha diferem. Estas diferenças não são devidas a nenhuma disparidade de visão filosófica; são conseqüências necessárias das diferentes condições econômicas nos dois Países. O padrão russo não seria aplicável na Alemanha, cuja população não pode viver num estado de subsistência mínima. O padrão alemão parece ser ineficiente quando comparado com o sistema capitalista, mas ainda assim é muito mais eficiente do que os métodos russos. Os russos vivem num nível econômico extremamente baixo, não obstante a riqueza inesgotável de seus recursos naturais.

Existem desigualdades de renda e de padrão de vida em ambos os países. Seria fútil tentar comparar a diferença do padrão de vida do camarada Göering e os demais membros comuns do partido, com a diferença entre o camarada Stalin e seus camaradas comuns. A característica principal do socialismo não é a igualdade de renda mas o controle total das atividades econômicas por parte do governo, seu poder exclusivo de usar todos os meios de produção.

Os Nazistas não rejeitam o Marxismo porque este almeja o socialismo, mas como eles dizem, porque advogam o internacionalismo. O internacionalismo de Marx nada mais era do que a aceitação das idéias do século dezoito sobre as causas das guerras: os príncipes estão sempre combatendo uns aos outros porque querem se engrandecer através da conquista, enquanto as nações livres não cobiçam o território dos seus vizinhos. Mas nunca ocorreu a Marx que esta propensão à paz depende da existência de uma sociedade de livre mercado. Nem Marx nem sua escola chegaram a entender o significado dos conflitos internacionais num mundo estatista e socialista. Eles se contentaram em assegurar que na Terra Prometida do socialismo não existiria mais nenhum conflito.

Já tivemos a oportunidade de ver como, nos tempo da Segunda Internacional, era questionável o problema da manutenção da paz. Para a Rússia Soviética a Terceira Internacional representou apenas uma ferramenta para sua perseverante luta contra todos os governos estrangeiros. Os soviéticos eram tão sequiosos de conquista quanto todos os conquistadores do passado. Eles não abriram mão de um centímetro das conquistas tzaristas, exceto quando forçados a faze-lo. Pelo contrário, usaram todas as oportunidades para expandir o império. É certo que eles não usam mais os mesmos pretextos dos Tzares; desenvolveram uma nova terminologia com este propósito. Mas isto não facilitava em nada a sorte dos povos subjugados.

O que os Nazistas realmente visavam quando acusavam a mentalidade judaica de internacionalismo, era a teoria liberal do livre comércio e das vantagens mútuas da divisão internacional do trabalho. Os Judeus, diziam, queriam corromper o espírito inato de heroísmo dos povos Arianos através das doutrinas falaciosas das vantagens da paz. Dificilmente alguém pode superestimar a contribuição judaica para a civilização moderna. A cooperação pacífica entre nações é certamente muito mais do que o resultado de maquinações judaicas. Liberalismo e democracia, capitalismo e comércio internacional, não são invenções judaicas.

Finalmente, os Nazistas denominavam o comércio de mentalidade judaica. Tácito nos informa de que as tribos germânicas de sua época já consideravam vergonhoso e inadequado adquirir pelo suor o que poderia ser conseguido pelo derramamento de sangue. Este também é o primeiro princípio moral dos Nazistas. Eles desprezam indivíduos e nações desejosos de ter lucro por servir a outros povos; aos seus olhos, o roubo é a maneira mais nobre de viver. Werner Sombart comparou duas espécies de seres humanos: os mascates (Händler) e os heróis (Helden). Os britânicos eram os mascates, os germânicos os heróis. Porém, mais freqüentemente o termo mascate é aplicado aos Judeus.

Os Nazistas simplesmente chamavam tudo que fosse contrário às suas doutrinas e dogmas, de Judaico ou comunista. Quando executavam reféns nos países ocupados, sempre declaravam estarem punindo Judeus e comunistas. Chamavam o Presidente dos Estado Unidos de Judeu e comunista. Quem não se rendesse a eles, era Judeu. No dicionário Nazista Judeu e comunista são sinônimos de não-Nazista.

Nos tempos anteriores à ascendência do liberalismo, os indivíduos que professavam um certo credo religioso formavam uma ordem, uma casta. O credo determinava a posição do membro no grupo, o qual designava a cada membro os privilégios e as desqualificações (privilegia odiosa). Só num número reduzido de países o liberalismo aboliu este estado de coisas. Em muitos países europeus, nos quais o respeito à liberdade de consciência e de prática religiosa e a igualdade de todos os cidadãos perante a lei estavam garantidas, as leis de casamento e o registro de nascimentos, casamentos e óbitos permaneceram separados para cada grupo religioso. A condição de membro de uma igreja ou comunidade religiosa preserva um caráter legal peculiar. Todo cidadão deve pertencer a um dos grupos religiosos e lega esta qualidade a seus filhos. A condição de membro e os procedimentos a serem observados no caso de troca de crença religiosa são regulamentadas em lei. Situações especiais estão previstas para aquelas pessoas que não querem pertencer a nenhuma comunidade religiosa. Tal estado de coisas permite determinar a fidelidade religiosa de cada pessoa e de seus ancestrais com precisão legal, da mesma forma que o parentesco para o efeito de herança.

A importância deste fato pode ser elucidada pelo contraste com as condições de pertencer a grupos lingüísticos. Pertencer a um grupo lingüístico não confere nenhuma qualidade de casta. É um fato aleatório, não um status legal. É geralmente difícil determinar o grupo lingüístico dos ascendentes já mortos de alguém. As únicas exceções são aqueles ancestrais que foram personalidades eminentes, escritores ou líderes políticos de grupos lingüísticos específicos. É também de maneira geral impossível determinar se alguém mudou seu idioma em algum momento passado. Quem fala alemão e se declara alemão raramente teme que esta afirmativa possa ser provada falsa por evidência documental de que seus pais ou ele mesmo não foram alemães no passado. Mesmo um sotaque estrangeiro não o trairia, pois em países de população lingüisticamente mista, o sotaque e a inflexão de cada grupo exerce influência nos demais. Entre os líderes do nacionalismo germânico nas áreas mais orientais da Alemanha, ou na Áustria, Tchecoslováquia e outros países do leste, existem inúmeras pessoas que falam alemão com forte sotaque eslavo, húngaro ou italiano, cujos nomes soam como se fosse estrangeiros ou que teriam recentemente trocado seus nomes de sonoridade germânica por outros nativos. Até mesmo membros das Tropas de Assalto Nazistas eram filhos de pessoas que não entendiam o alemão. Freqüentemente até mesmo irmãos pertenciam a grupos lingüísticos diversos. Seria impossível qualquer discriminação contras tais neófitos, porque seria impossível determinar os fatos de forma legalmente inquestionável.

Numa sociedade de livre mercado não há discriminação legal contra ninguém. Todos têm direito a seu lugar no sistema social, dentro do qual poderão trabalhar e ganhar a vida. O consumidor é livre para escolher o que quer comprar, desde de que pague o preço. Um Tcheco ou um Polonês pode preferir pagar mais caro na loja de um eslavo do que mais barato e melhor em outra de um alemão. Um anti-semita pode abrir mão de ser curado por uma droga produzida por um Judeu e usar um remédio comprovadamente menos eficaz. É neste poder arbitrário que está o que os economistas chamam de soberania do consumidor.

Intervencionismo significa discriminação compulsória ao proteger os interesses de uma minoria às expensas da maioria. No entanto, a discriminação pode existir até mesmo numa sociedade democrática. Vários grupos minoritários podem formar uma aliança, tornando-se majoritário, para obter privilégios para cada um deles. Por exemplo, os produtores de trigo, os criadores de gado e os vinicultores podem formar um partido agrário e conseguir discriminar os competidores estrangeiros obtendo, com isto, privilégios para cada um dos três grupos. O custo dos privilégios dos vinicultores recaem sobre o resto da comunidade – incluindo os criadores de gado e os produtores de trigo – e assim por diante.

Quem quer que veja os fatos sob esta ótica – e, na verdade, não existe outra – percebe que os argumentos a favor de qualquer privilégio são indefensáveis. Um único grupo minoritário não pode obter tais privilégios porque a maioria não toleraria. Mas se todos os grupos minoritários – ou uma quantidade suficiente deles – consegue um privilégio, qualquer grupo que não o consiga, sofrerá as conseqüências. A ascendência política do intervencionismo é devida à incapacidade de reconhecer esta verdade óbvia. As pessoas preferem discriminação e privilégios porque não percebem que elas mesmas são os próprios consumidores, e como tais, pagam a conta. No caso do protecionismo, por exemplo, as pessoas acreditam que só os estrangeiros sofrem com as taxas de importação. Mas isto é só parte da verdade: os consumidores pagarão preços mais altos – e sofrerão juntos.

Aonde quer que existam minorias judaicas – e eles são minoria em todos os países – é fácil discrimina-los legalmente como aos estrangeiros, porque a qualidade de ser um Judeu pode ser estabelecida de forma legal. A discriminação contra as minorias indefesas pode até ser aceita como plausível, pois parece defender os interesses de todos os não-Judeus. A população não se dá conta de que certamente ofende os interesses dos não-Judeus também. Se os Judeus são impedidos de seguir a carreira médica, os interesses dos médicos não-Judeus são defendidos, mas não o interesse dos doentes, que são prejudicados. Seu poder de escolher o médico de sua confiança é restringido. Aqueles que não quisessem consultar um médico Judeu não ganham nada, mas o que os preferiam saem perdendo.

Em muitos países europeus é possível discriminar legalmente os Judeus e seus descendentes. É ainda mais possível a discriminação política porque os Judeus são geralmente minorias insignificantes em termos de votos. E, finalmente, tal discriminação é considerada legítima numa época em que o governo está empenhado em proteger os produtores menos eficientes contra os mais eficientes e baratos e obtém apoio público para estas práticas. O dono de armazém não-Judeu pergunta, por que não me proteger também? Se o governo protege os industriais e os fazendeiros contra a concorrência externa que produz melhor por menor preço; se protege o operário contra a competição com os imigrantes; também deveria me proteger contra meu vizinho Judeu.

Discriminação não tem necessariamente a ver com ódio ou repugnância contra os discriminados. Os suíços e italianos não odeiam os americanos ou os suecos, mas discriminam seus produtos. Ninguém gosta de competição. Mas para o consumidor os estrangeiros que fornecem mercadorias não são competidores, mas simplesmente fornecedores. O médico não-Judeu pode odiar seu competidor Judeu, mas ele exige a expulsão do último exatamente porque muitos pacientes não-Judeus não somente não odeiam médicos Judeus como os preferem. O fato de que as leis raciais Nazistas impõem grandes penas por relações sexuais entre Judeus e “Arianos” não indica a existência de ódio entre os dois grupos. Por que se proibiriam as relações sexuais entre pessoas que se odeiam? Numa investigação dos problemas políticos do nacionalismo e do Nazismo não é necessário entender nenhuma patologia sexual envolvida. Estudar os sentimentos de inferioridade e as perversões sexuais responsáveis pelas leis raciais de Nüremberg e as bestialidades sádicas cometidas contra os Judeus, é tarefa para a psiquiatria.

Num mundo em que as pessoas entendem o significado da economia de mercado – e, conseqüentemente, defendem uma política voltada para o consumidor - não há discriminação contra os Judeus. Quem quer que não goste de Judeus simplesmente evitará lojas, médicos ou advogados Judeus. Por outro lado, num mundo intervencionista, só um milagre impedirá a discriminação legal contra eles. A política de proteger os ineficientes produtores internos contra os mais eficientes produtores estrangeiros, o artesão contra o industrial e o pequeno comércio contra as lojas de departamentos, levará inevitavelmente à proteção dos “Arianos” contra os concorrentes Judeus.

Várias décadas de propaganda anti-semita não impediram os alemães “Arianos” de comprar em lojas de propriedade de Judeus, de consultar médicos ou advogados Judeus ou de ler livros de autores judaicos. Não havia realmente proteção aos Judeus – os concorrentes “Arianos” tinham muito cuidado de dizer que estas pessoas eram Judeus. No entanto, quem quisesse se livrar de seus concorrentes Judeus não poderia confiar somente no ódio a eles, mas precisava exigir a discriminação legal.

Esta discriminação não é o resultado de nacionalismo ou racismo. É, basicamente – como o nacionalismo – o resultado do intervencionismo e da política de favorecimento dos produtores ineficientes, com grandes prejuízos para os consumidores.

Quase todos os escritores que se dedicaram ao problema do anti-semitismo tentaram demonstrar que os Judeus tem, de uma maneira ou de outra, através de comportamentos ou atitudes, estimulado o anti-semitismo. Até mesmo autores Judeus ou outros que se opõem ao anti-semitismo partilham desta opinião. Também procuram defeitos nos Judeus que seriam a causa do anti-semitismo. Mas se a investigação das causas do anti-semitismo tivessem algo a ver com características próprias a eles, só poderia resultar na descoberta de extraordinárias virtudes e méritos – o que os qualificaria como a elite da humanidade. Se os próprios Judeus devem ser acusados pelo fato de que aqueles para os quais o ideal é a perpétua guerra e banhos de sangue, que adoram a violência e desejam ardentemente destruir a liberdade, os consideram os mais perigosos oponentes, deve ser porque os Judeus são os principais defensores de liberdade, justiça e cooperação pacífica entre as nações. Se os Judeus incorreram no ódio Nazista por sua própria conduta, sem dúvida será porque o que há de maior e mais nobre na nação Germânica, todas as realizações imortais do passado alemão, foram conseguidos pelos Judeus ou são afins da mentalidade judaica. Como os partidos que tentam destruir a civilização moderna e retornar à barbárie colocaram o anti-semitismo nos primeiros itens de seus programas, é porque esta civilização é aparentemente criação dos Judeus. Nada mais lisonjeiro pode ser dito de um indivíduo ou grupo de que os inimigos mortais da civilização têm fundadas razões para persegui-los.

A verdade é que enquanto os Judeus são o objeto do anti-semitismo, sua conduta e qualidades não influíram decisivamente na moderna provocação e disseminação. O fato de que eles sejam sempre uma minoria que pode ser legalmente definida, torna tentador discrimina-los, numa época de intervencionismo. Os Judeus certamente contribuíram para o aparecimento da civilização moderna, embora ela não seja total nem predominantemente realização judaica. Paz e liberdade, democracia e justiça, razão e pensamento, não são especificamente Judeus. Muitas coisas boas ou más ocorrem na Terra sem a participação dos Judeus. Os anti-semitas exageram grosseiramente quando vêem nos Judeus os principais representantes da cultura moderna e os tornam os únicos responsáveis pelas mudanças ocorridas no mundo desde os tempos das invasões bárbaras.

Na idade das trevas, Cristãos e Muçulmanos perseguiram os Judeus por sua religião. Este motivo perdeu muito de sua força e só é ainda válido para poucos Católicos e Fundamentalistas que culpam os Judeus pela disseminação do livre pensamento. E até isto está errado. Nem Hume, Kant, Laplace ou Darwin eram Judeus. A crítica mais contundente à Bíblia é obra dos teólogos Protestantes. Os Rabinos se opuseram tenazmente a ela por muitos anos.

Nem o liberalismo, o capitalismo ou a economia de mercado foram realizações judaicas. Existem os que tentam justificar o anti-semitismo denunciando os Judeus como capitalistas e defensores do laissez faire. Outros anti-semitas – geralmente os mesmos – culpam os Judeus de serem comunistas. Estas acusações contraditórias se cancelam mutuamente. Mas é um fato que a propaganda anticapitalista contribuiu muito para a popularidade do anti-semitismo. Mentes simplórias não conseguem entender o significado abstrato de termos como capital e exploração, capitalistas e exploradores, e os substituem por Judaísmo e Judeus. No entanto, mesmo que os Judeus fossem mais impopulares com algumas pessoas do que é o caso, não haveria discriminação se eles não constituíssem uma minoria claramente distinguível em termos legais.




LUDWIG VON MISES*



*O pensador liberal Von Mises redigiu este escrito em 1944, o mesmo ano em que publicava “Burocracia”, uma das obras mestras do século XX.


Pela tradução - Heitor de Paola

Tirado da página Endireitar


1 comentarios:

Que grande texto! Que clareza de pensamento e que lucidez!

Votos de muita paz,

AA

09/05/11, 00:17