David Rosen, antigo Rabino Chefe de Irlanda, dirige o Departamento de Assuntos Interreligiosos do American Jewish Committee. No The Jerusalem Post de ontem (30 de Março), o Rabino Rosen publica um adulador escrito –“O Papa Benedicto XVI e os judeus”- sobre a próxima visita do Papa a Israel.
Lemos no subtítulo do artigo de Rosen: “Descrevendo o ánti-semitimo como um assalto contra as raízes da Cristandade, Benedicto declara que para um cristão albergar esse tipo de sentimentos é traizoar a sua própria fê”. De ser isto certo, os cristãos em geral, e o Papa Benedicto em particular, deveriam considerar aos muçulmãos –os mais ferozes e violentos dos ánti.semitas- como inimigos da Cristandade. Esta inferência deveria resultar óbvia, mas não é trivial fazer menção de ela, como vamos a ver.
Rosen afirma que Benedicto dixo na visita a uma sinagoga de Colônia em Agosto de 2005: “Hoje quero reafirmar que continuarei com grande vigor na senda de estreitar relações com o povo judeu, seguindo o passo decisivo emprendido pelo Papa João Paulo II”. Benedicto estava aludindo ao estabelecimento de relações diplomáticas plenas entre o Vaticano e Israel em 1994, sob os auspícios de João Paulo II.
O Rabino Rosen oferece-nos também esta servil cita: o Papa Benedicto XVI “tem uma profunda comprensão do significado do Estado de Israel para o povo judeu”. Pergunto-me, sem embargo, se Rosen tem realizado um estudo objectivo da actitude de Benedicto face o Judaísmo, e se está ao tanto da posição moral absolutamente neutral do Papa no que concerne ao conflito entre Israel e os seus inimigos islâmicos. Os seguintes comentários do antigo professor e Cardenal Joseph Alois Ratzinger estám tirados do meu livro “Uma filosofia judea da História”.
Antes de converter-se no Papa Benedicto XVI em 2005, o Cardenal Ratzinger escreveu um artigo intitulado “Reconciliando os Salmos e a Torá: o Catecismo” (1 de Abril de 1996). O Professor Sergio I. Minerbi, que tem estudado profundamente a Igreja Católica, observa um duplo significado no termo “Reconciliar”. Duma banda, “reconciliar” é lograr que os adversários cheguem a ser amigos. Doutra banda, “reconciliar”, no contexto religioso, pode significar também converter aos judeus à cristandade.
Num dos seus livros, o Cardenal Ratzinger ataca subtilmente o judaísmo afirmando que “o Novo Testamento é simplesmente uma interpretação da Tanaj, começando pela história de Jesus”. Reconhece audazmente, diz Minerbi, “que a Tanaj durante a época de Jesus aínda não alcançara a sua forma final nem passara a formar parte definitivamente do canon. Ratzinger propunha [contrariamente a Romanos 9, 10 e 11] uma nova versão da velha teoria da supercessão [ou reempraçamento teológico] dacordo com a qual a Igreja é a autêntica Israel”.
Äs igrejas do reempraçamento teológico abarcam o 63 % dos asistentes nas igrejas norteamericanas. Isto inclui o Conselho Mundial das Igrejas, o Conselho Nacional das Igrejas, e a Igreja Presbiteriana dos EEUU. Neste aspecto, o Cardenal Ratzinger concorda com estas igrejas protestantes).
Num documento do 6 de Agosto de 2000, Ratzinger escreveu que o único caminho para a salvação é aderir à Igreja Católica. O 7 de Julho de 2007, o Papa Benedicto reinstaurou a Missa em latim que permite aos católicos orar para a conversão dos judeus. Dixo que não existem alternativas para a salvação. Isto não é tudo respeito a actitude da Igreja face os judeus.
Como sinala Minerbi, inclusso durante o papado de João Paulo II, “a petição para o perdão do povo judeu não se faz em nome da própria Igreja, senão, mais bem, só no nome daqueles que figeram dano aos judeus”. O Papa João Paulo negava, desse modo, que a Igreja e o Novo Testamento tivessem responsabilidade alguma no ánti-semitismo. Isto, por suposto, é puro escurantismo. Alguns teólogos cristãos, em ensaios compilados por Alan Davies, estabelecem a linha de união entre o ánti-semitismo e o Novo Testamento –óbvia para qualquer leitor, por cândido que seja.
Para limpar a reputação da Igreja, Ratzinger distingue entre ánti-semitismo pagano –que ele atribui ao nazismo- e vulgar ódio aos judeus. Afirma que a Igreja nunca foi aliada do ánti-semitismo názi, senão que mais bem foi uma mais das suas vítimas. Noutras palavras, interpreta a causa do ánti-semitismo názi como um ataque, não contra os judeus, senão contra a cristandade!
Mais adiante, o 28 de Maio de 2006, o Papa Benedicto XVI visitou Auschwitz –onde mais do 90 % das vítimas foram judeus. No seu discurso citou uma frase de João Paulo II, que previamente dissera no mesmo lugar: “Seis milhões de polacos perderam a sua vida durante a 2ª Guerra Mundial –a quinta parte da nação”. Minerbi comenta que “utilizando a expressão ‘seis milhões’ combinando os três milhões de polacos judeus com os três milhões de polacos de étnia, o Papa estava, em efecto, apropriando-se da Shoá. Isto compadece-se com o facto de que a Igreja tem intentado sistematicamente apresentar-se a sim própria como vítima do nazismo, e portanto exonerar-se de qualquer responsabilidade no assassinato de judeus”.
Por último, umas palavras sobre a actitude da Igreja Católica face o terrorismo e Israel. Dacordo com o Professor Minerbi, o Papa João Paulo II nunca condeou expressamente o terrorismo palestiniano. Quando o Papa condeou actos terroristas, fixo-o referindo-se ao terrorismo internacional, sem fazer menção alguma ao terrorismo palestiniano. De facto, em duas ocasiões, Yasser Arafat, o padrinho do terrorismo internacional que, de palabra e facto, estava comprometido com a aniquilação de Israel, esteve convidado no Vaticano durante o papado de João Paulo II. O 15 de Fevereiro de 2000, o Vaticano e Arafat asinaram um acordo rechaçando que Jerusalém fosse a capital de Israel.
Embora o Papa Benedicto XVI tenha dito que nenhuma situação pode justificar o terrorismo, ele sem embargo tem adoptado uma posição ánti-israeli vis-a-vis com os inimigos terroristas de Israel. A propósito da Segunda Guerra do Líbano e o ataque de Hezbolá contra Israel o 12 de Julho de 2006, o Papa dixo: “Na orige desta devastadora confrontação existem, por desgraça, situações objectivas de violação da lei e a justiça. Mas jamais os actos terroristas nem as represálias podem ser justificadas, especialmente quando acarream trágicas conseqüências para a população civil”. Isto vem a ser o mesmo que pedir “não vos oponhades ao mal”. O Papa situava os actos terroristas de Hezbolá e a resposta israeli num mesmo plano moral: para ele nada tem justificação. Semelha que o Papa Benedicto XVI tem sucumbido à equivalência moral, que resulta absurda no Novo Testamento. Quizás aqueles preocupados pelas implicações teológicas do renascimento de Israel tendem a sacrificar o seu intelecto em aras das suas emoções. Crítica que, por suposto, seria aínda mais grave se a referíssemos ao Rabino Rosen.
PAUL EIDELBERG
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