POLÍTICA RELIGIOSA

Tenho as minhas reservas sobre o mistério da Trindade –mas também a tinham muitos cristãos ao começo, e o conceito não existe nos Evangelhos sinópticos. Quando os judeus adornam os rolos da Torá com coroas de prata, não tenho autoridade moral para criticar os retratos de D’us nas catedrais cristãs.

Nos Evangelhos sinópticos, Jesus apenas diz nada que seja contrário ao Judaísmo. O seu Sermão da Montanha é uma cópia em papel carbão das orações e pregárias judeas. A Apocalipse de João é comumente admitida pelos estudosos como um texto de apocalipse judea. Tudo o mencionado entre esses dois textos tem paralelismos na Torá e na literatura rabínica.

A resurrecção não é algo exclussivo de Jesus. O profeta judeu Eliseu resuscitou a uma mulher. A miragre de Jesus de alimentar a uma multidão com um bolo de pão é semelhante à de Eliseu.

Na melhor das tradições kahanistas, Jesus declarou que ele só vinhera para os judeus. Detestou ter que curar a uma samaritana, comparando-a com um cão. Os samaritanos são uma secta judea, quase judeus –assim que imaginade a actitude de Jesus face os gentis…

Jesus aderia à Lei judea. De facto, anunciou: “Até o fim dos céus e da Terra, nem a mais pequena das letras quebrantará a Lei”. “Assim que quem quebrante o mais ínfimo destes mandamentos e ensine outros será insignificante no reino dos céus. Mas quem os observe e ensine será grande no reino dos céus”. “Se queredes acceder à vida eterna, deveis observar os Mandamentos”.

A opinião de Jesus do judaísmo rabínico era muito elevada: “Fazede tudo conforme voz dizem, mas não como eles o fazem, porque não praticam o que predicam”. Admitia que os rabinos fariseus possuiam a única chave que dava entrada ao reino dos céus. Também utilizava parábolas, ferramenta habitual na exégese rabínica.

Jesus acusava aos rabinos de hipocresia, mas geralmente não fazia objecções às suas ensinanzas. Aceitava a legitimidade dojejum extra-bíblico, e só solicitava que os seus seguidores fossem exonerados de fazer jejum temporalmente, mentres estivessem com ele. Pode haver discussões insignificantes, como se é mais importante o juramento ou a oferenda ante o altar, ou se está permitido fazer curações em Shabat. Jesus era um progressista, se aplicamos os critérios antigos, na medida em que permitia que os seus discípulos colheitassem em Shabat para saciar a fome. Mas hoje em dia a maioria dos rabinos ortodoxos estariam dacordo com a sua interpretação. Os judeus reformistas são muito menos observantes do que era Jesus, e ele era decididamente muito menos idólatra que a maioria dos rabinos ortodoxos actuais. Inclusso, intentou pôr freio à farisaica idolatria nos rituais.

Jesus acusou aos rabinos de luzir tzitzit demassiado longos e tfilin muito grandes –sem negar a necessidade de ambas coisas-, inclusso a pesar de que muitos judeus para além dos fariseus e os esênios não usavam tfilin. Até o Cantar dos Cantares pede ao amado “Põe-me como selo sobre o teu coração, como selo sobre o teu braço”, o que sugire uma ampla aceitação do mandamento dos tfilin como mera metáfora.

Mais questionável é o facto de que Jesus concebisse o Judaísmo como uma religião sem Estado na sua afirmação de “Darde ao César o que é seu, e dade a D’us o que é de D’us”. Mas o mesmo faziam os rabinos do Exílio com o seu aserto de que “A lei terrenal é lei”.

Nos Evangelhos sinópticos, Jesus nunca manifesta uma especial afinidade com D’us. Aínda mais, chama a todos os judeus –não só a sim próprio- “filhos de D’us”, e a D’us o seu “pai”. Não tem por que resultar excepcional para os judeus elogiar a alguém como “filho de D’us”. De igual modo era chamado Hanina ben Dosa [nota: discípulo de Yohanan ben Zakkai do século I, cujas miragres estám recolhidas no Talmud].

A designação como Messias é teologicamente mundana. Os rabinos declararam a Bar Kochba como Messias, e outro tanto Ciro, Rabbi Luria e, mais recentemente, o Rebbe de Lubavitcher.

A fê em Jesus também tem um precedente. D’us proclamou que os judeus deviam acreditar em Moisês (Éxodo 19:9).

Os apóstolos receberam o espírito sagrado e começaram a profetizar, exactamente igual que os setenta ancianos judeus figeram na congregação fundada por Moisês (Números 11:25). Não importa, para o nosso propósito, se o relato dos apóstolos é verdadeiro ou falso: é algo que cai fóra da Lei judea.

O relato sobre o nascimento de Jesus é algo que não deveria comocionar a um judeu minimamente educado. Sansom foi concebido duma maneira semelhantemente miragrosa e, probablemente ao igual que Jesus, era nazareno. O assassinato de inocentes na época do nascimento de Jesus está intimamente relacionado com o acontecimento acaecido durante o nascimento de Moisês. Os magos e a estrela (em Beth Lehem) têm aromas de Abraham.

Por que opôr-se, pois, à presença de messiânicos em Israel? A simples crença na missão messiânica de alguém não converte a um judeu num apóstata. Em certo modo, os messiânicos são mais religiosos que o típico reformista judeu.

Apenas nada, portanto, tenho contra o cristanismo.


Agás a desafortunada circunstância de que, durante os últimos quinze séculos, tenha constituído uma ideologia baseada na repressão e extermínio dos meus correligionários judeus.



OBADIAH SHOHER


17 Iyar 5769 / 11 Maio 2009


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